quarta-feira, 8 de abril de 2009

Com gelo até dinheiro

- Qualquer coisa desce com gelo, até álcool puro... Quer dizer, pensando bem, vodka eu resisto um pouco. É preciso algo mais, tipo uma laranjinha ou um limão.
- Eu tomei muita vodka com açúcar e gelo ontem.
- O gelo anestesia. O açúcar adoça.
- Eu mais sofro de amnésia, nem passo mal. Mas a falta de memória é o ponto fraco da nossa relação (eu e a vodka). Nem sei se essa seria a palavra (memória), acho que perco os detalhes a minha volta... É engraçado. Acho que foi por isso que me roubaram ontem... Tô brincando.O povo é profissional, eu que nem percebi.
- Sim, vodka provoca uma perda da consciência. Por isso eu gosto de vinho, fico tribebada, mas completamente atenta.
- Nunca te vi tribebada. Talvez já, mais tu fica tão atenta que não percebi...
- Sim. Continuo sempre alerta.
- Alerta sempre! Se as pessoas respeitassem a luz amarela nos semáforos, não haveria acidentes.
- Ou se respeitassem a luz amarela em suas intuições. Vodka com açúcar e gelo é morte certa. Ao menos da consciência. O que pode ser bom, mas...
- Por mais que pareça que a preferência é nossa, ou que o tempo seja nosso aliado, coisa impossível, é preciso cautela sempre. Sempre ativos, alertas e felizes, “sorria sempre”.
Tempo.
- Afinal, de que vale a tristeza?
- Nada.
Tempo.
- Se bem que tristeza não tem fim.
- É como dizer que não tem início
- É sim. “Tristeza não tem fim/ felicidade sim”, já diz o samba.
- Falando nisso, sempre há algo que te deixa triste ou feliz, o que muda é a intensidade ou pra onde irá focar o olhar... Eu estou feliz agora, mas posso procurar algo para me deixar triste.
- Eu já acho que não existe nada que me deixe triste. Acho a tristeza apenas falta de felicidade. Quando ela começa, porque ela sim tem começo, a gente esquece da tristeza um pouco.
- Você só estaria renomeando o sentimento, já que é abstrato. E você tem esse direito.
- Não estou renomeando. Reconceituando, talvez.
- No fim são as mesmas coisas. Como somos todos farinha do mesmo saco, umas usadas para bolos ou tortas, e outros apenas para engrossar o angu...
- E quem se importa com o fim?
- Eu não me importo. Se hoje temo a morte é por não ser egoísta como queria. É por pensar que no fim só eu que não vou sofrer.
- Se só você não vai, então isso passa. As pessoas que importam percebem quando você não sofre e se alegram com isso mais do que sofrem por sentir sua falta. Pode demorar, mas acontece. De qualquer forma você jamais saberá. A morte só existe para os vivos.
- Mas gosto mais de viver, espero que Deus leve isso em conta... E gosto do poder que o dinheiro me dá... O bom uso do poder.
- “Bom uso”, sei. Mesmo quando assaltado?
- Sim, porque eu não ligo pra o assalto, o dinheiro serve também pra ser roubado. Porque tudo é bom quando bem usado. Anota isso aí.
- Está bem. Deve ser que nem o álcool com gelo. Vou anotar, então: tudo é bom quando bem usado, até dinheiro.
Tempo. Dinheiro.
- Anotei diferente, mas fica assim. Que que você acha?
“Qualquer coisa é boa quando é bem usada,
com gelo, até dinheiro”.

Cind Canuto